Paulo Sacramento nos apresenta um documentário gravado no presídio do Carandiru, meses antes da desativação do mesmo. É uma visão mais realista que o longa mais conhecido sobre o tema (Carandiru, 2003, de Hector Babenco), não só pelo estilo de documentário despido de fabulações, mas também por muitas filmagens terem sido feitas pelos próprios detentos.
Evidentemente as tomadas feitas pelos presos podem ser taxadas de parciais e podem mostrar apenas o pior lado do sistema prisional – assim como qualquer edição ou qualquer obra que vise o circuito comercial –, de qualquer forma é interessante acompanharmos os dias e noites que mostram a diversidade que existe entre a massa de detentos, tratados da mesma maneira, independente do delito que tenham cometido.
Os dias longos de cárcere demandam atividades que variam entre trabalhos simples, como confecção de pipas e bolas de futebol; atividades artísticas como desenhos e esculturas, algumas rudimentares, mas outras que impressionam pela qualidade; religiões diversas contam com adeptos do catolicismo, candomblé, evangélicos, etc. E atividades ilícitas como produção da chamada “maria louca”, a cachaça de restos de comida; separação de pedras de crack e papelotes com maconha. Há uma série de equívocos por trás da presença de drogas na cadeia, afinal alguém permite que estas substâncias cheguem até os presos, os carcereiros sem auxílio policiais – quase sempre mal preparados – não têm condições de arriscar a própria vida para coibir o tráfico interno e devemos considerar o fato de que drogas como o crack geram alta dependência do usuário. É extremamente difícil abandonar o vício quando em liberdade e com apoio de pessoas próximas, mais ainda quando o usuário está encarcerado, sem tratamento para desintoxicação e estimulado pelos presos a continuar.
Algumas críticas que um filme desse tipo recebe são previsíveis. Antes mesmo de assistir, apenas pela descrição da obra, logo diversos indignados se reúnem dispostos a acenderem suas tochas e partirem para a caça às bruxas, argumentando que os detentos não estão em hoteis cinco estrelas, que devem pagar pelos seus erros e contam com mais regalias do que deveriam. De fato alguns daqueles homens proporcionaram terrores inenarráveis às suas vítimas, e devem pagar pelos seus erros, porém tratá-los como animais selvagens não atestaria seus comportamentos desumanos? Além disso, nem todos os detentos cometeram crimes hediondos, sendo que muitos por delitos leves vivem em meio aos ratos, com atendimento médico que permite que uma úlcera ressalte na barriga de um detento tal qual um alien prestes a nascer, uma perna fique necrosada ou que uma tuberculose ganglionar deforme completamente o pescoço de um ser humano.
Há um consenso nas sociedades em geral de que as condições de vida em um presídio devem ser piores que as piores moradias dos que não estão presos. Isso explica um pouco dos motivos que levam a cidade mais rica do país manter jaulas de seres humanos tão precárias, pois não há outra forma de manter um presídio pior que palafitas e favelas, diante das quais o governo insiste em não tomar providências. Agrada a classe média que defende o sofrimento dos detentos – mesmo que esses maus tratos venham sendo aplicados sem resultados há décadas – e, como indica um detento, mantém os presos sem instrução e sem senso crítico que possa gerar protestos conscientes contra um estado corrupto, que desvia rios de dinheiros sem nenhum tipo de punição para classes que economicamente formam o topo da sociedade, mas em atitudes formam uma escória de ladrões impunes.
Diante das imagens que mostram detentos sendo tratados de forma semelhante aos escravos, ou até pior, fica a dúvida: se a sociedade os trata tão mal, como eles tratarão a sociedade quando forem libertados?
(O filme pode ser conferido integralmente no YouTube)
Evidentemente as tomadas feitas pelos presos podem ser taxadas de parciais e podem mostrar apenas o pior lado do sistema prisional – assim como qualquer edição ou qualquer obra que vise o circuito comercial –, de qualquer forma é interessante acompanharmos os dias e noites que mostram a diversidade que existe entre a massa de detentos, tratados da mesma maneira, independente do delito que tenham cometido.
Os dias longos de cárcere demandam atividades que variam entre trabalhos simples, como confecção de pipas e bolas de futebol; atividades artísticas como desenhos e esculturas, algumas rudimentares, mas outras que impressionam pela qualidade; religiões diversas contam com adeptos do catolicismo, candomblé, evangélicos, etc. E atividades ilícitas como produção da chamada “maria louca”, a cachaça de restos de comida; separação de pedras de crack e papelotes com maconha. Há uma série de equívocos por trás da presença de drogas na cadeia, afinal alguém permite que estas substâncias cheguem até os presos, os carcereiros sem auxílio policiais – quase sempre mal preparados – não têm condições de arriscar a própria vida para coibir o tráfico interno e devemos considerar o fato de que drogas como o crack geram alta dependência do usuário. É extremamente difícil abandonar o vício quando em liberdade e com apoio de pessoas próximas, mais ainda quando o usuário está encarcerado, sem tratamento para desintoxicação e estimulado pelos presos a continuar.
Algumas críticas que um filme desse tipo recebe são previsíveis. Antes mesmo de assistir, apenas pela descrição da obra, logo diversos indignados se reúnem dispostos a acenderem suas tochas e partirem para a caça às bruxas, argumentando que os detentos não estão em hoteis cinco estrelas, que devem pagar pelos seus erros e contam com mais regalias do que deveriam. De fato alguns daqueles homens proporcionaram terrores inenarráveis às suas vítimas, e devem pagar pelos seus erros, porém tratá-los como animais selvagens não atestaria seus comportamentos desumanos? Além disso, nem todos os detentos cometeram crimes hediondos, sendo que muitos por delitos leves vivem em meio aos ratos, com atendimento médico que permite que uma úlcera ressalte na barriga de um detento tal qual um alien prestes a nascer, uma perna fique necrosada ou que uma tuberculose ganglionar deforme completamente o pescoço de um ser humano.
Há um consenso nas sociedades em geral de que as condições de vida em um presídio devem ser piores que as piores moradias dos que não estão presos. Isso explica um pouco dos motivos que levam a cidade mais rica do país manter jaulas de seres humanos tão precárias, pois não há outra forma de manter um presídio pior que palafitas e favelas, diante das quais o governo insiste em não tomar providências. Agrada a classe média que defende o sofrimento dos detentos – mesmo que esses maus tratos venham sendo aplicados sem resultados há décadas – e, como indica um detento, mantém os presos sem instrução e sem senso crítico que possa gerar protestos conscientes contra um estado corrupto, que desvia rios de dinheiros sem nenhum tipo de punição para classes que economicamente formam o topo da sociedade, mas em atitudes formam uma escória de ladrões impunes.
Diante das imagens que mostram detentos sendo tratados de forma semelhante aos escravos, ou até pior, fica a dúvida: se a sociedade os trata tão mal, como eles tratarão a sociedade quando forem libertados?
(O filme pode ser conferido integralmente no YouTube)