segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Senna

Uma obra que junta duas das minhas grandes paixões, cinema e automobilismo, não poderia ficar de fora deste blog. Talvez as expectativas tenham sido um pouco frustradas pelo olhar técnico, tanto do ponto de vista cinematográfico quanto pela Formula 1 em si, de forma que o documentário acaba sendo mais produtivo para quem quer um resumo da carreira de Senna do que para os que conhecem bastante a trajetória do piloto.

Diante dos inúmeros caminhos que o documentário poderia seguir, o diretor britânico Asif Kapadia escolheu o que deve ser mais fácil para alguém que provavelmente não conhece muito sobre o esporte, ou seja, ratificar a ideia de mito que sempre marcará qualquer lembrança do piloto. Assim, todo o roteiro escrito por Manish Pandey explora os elementos da carreira de Senna, que de fato são bastante favoráveis para desenvolver uma verdadeira lenda, e a montagem utiliza as técnicas cinematográficas, como trilha sonora, depoimentos e principalmente a ordem das sequências exibidas, para emocionar e conquistar o público.

Socialmente dá para identificar através do filme um comportamento bastante característico dos brasileiros em relação aos seus ídolos esportivos, refletido pelo grande carisma que tinham por Senna. Comparando com outros esportes notamos grande apoio da torcida do país, ainda que não tenham grande identificação com a modalidade em questão. É válido o argumento de que Senna trouxe alegria para um país que vivia uma fase bastante difícil – ainda que a opinião de Arnaldo Jabor inserida no filme tenha sido, como sempre, dispensável –, porém o que contribui para a criação do mito é o comportamento do esportista, também valorizado pelos torcedores, ou seja, a vontade de vencer prevalecia mesmo quando não havia chances de vitória, e a alegria de uma vitória fazia com que o sujeito tímido explodisse em grande euforia. Esse fato também é valorizado no documentário através da forma como são apresentados Alain Prost e Jean-Marie Balestre, que se por um lado tiveram comportamentos lamentáveis em muitas situações, por outro não são exceções no mundo esportivo, em que muitas vezes a política torna-se decisiva, como indica o próprio Senna.

Aos fãs de Formula 1, que acompanham os campeonatos independente da presença de Senna, o filme pode decepcionar um pouco, tanto pelas poucas cenas de corridas, quanto pela limitação destas cenas aos momentos decisivos, para vitórias ou polêmicas. Neste sentido fica evidente que Asif Kapadia teve contato com a Formula 1 exclusivamente para a montagem do documentário, pois ressaltar a temporada de 1993 sem ao menos fazer menção à corrida perfeita de Donington Park pode ser interpretado como um erro grave do filme, assim com a ausência de cenas clássicas tais quais as voltas empunhando a bandeira brasileira após as vitórias ou a carona na Willians de Nigel Mansel. Neste sentido o documentário “Uma estrela chamada Ayrton Senna” (dirigido por Ellen Goosenberg Kent em 1998) comete a mesma falha de inserir pouco material de corrida, com o agravante de incluir uma trilha sonora terrível. Já o filme “Grand Prix”, dirigido por John Frankenheimer em 1966, conta com imagens fantásticas, mas peca por enfatizar os romances e intrigas fora das pistas, ao invés das corridas.

Mesmo com algumas críticas, é inegável que o documentário de Kapadia agrada e muito, afinal foi nitidamente montado para emocionar e agradar aos fãs do piloto. É possível lembrar (ou conhecer) fatos importantes na carreira de Senna, reviver as emoções da primeira vitória no Brasil, a garra com que buscava os resultados perfeitos, etc. Resta aos fãs da Formula 1 como um todo esperar por uma obra complementar, que mostre o piloto por trás do mito, livre de interesses comerciais do cinema e que se preocupe mais com as disputas de corridas, que evidentemente ocorriam também fora das pistas, mas de forma muito mais psicológica do que podemos ver com a direção de Kapadia, e nas quais Senna também era campeão.




Nenhum comentário:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...