quarta-feira, 12 de junho de 2013

Terapia de Risco (Side Effects)

Se por um lado o homem vem desenvolvendo a medicina há milênios, com registro de cirurgias complexas desde a civilização egípcia, há mais de cinco mil anos, por outro muitos afirmam que ainda estamos engatinhando no que diz respeito à cura. De fato alguns procedimentos ainda são extremamente invasivos, outros agressivos ou pior, empíricos, com bases quase intuitivas, como alguns tratamentos psiquiátricos.

O diretor Steven Soderbergh aborda esse aspecto incluindo os obstáculos da medicina contemporânea, que além das dificuldades biológicas deve driblar os problemas criados pelo homem. Entre eles a especulação financeira dos grandes laboratórios, a indústria de seguros, os processos, além de uma característica que não entra no filme – talvez brasileira demais – a máfia dos planos de saúde.

Não são raras as vezes que um médico acaba sendo peça chave em um julgamento, assim Dr. Jonathan Banks (Jude Law). Frequentemente só ele pode dar um veredicto sobre as condições clínicas do réu em determinado crime, mas há muitas coisas por trás disso. Tudo fica ainda mais complexo quando se trata de um paciente com distúrbios psicológicos.

Quem dera houvesse um exame de sangue, ou algo do tipo, que indicasse os níveis ideais de serotonina, dopamina e outros neurotransmissores, dentro de um espectro pré-definido, como a diabetes ou colesterol, entretanto para os antidepressivos, médico e paciente podem levar muito tempo testando doses e princípios ativos, até chegar ao medicamento ideal.

Dr. Banks faz o procedimento padrão de testar um medicamento. Seria desta forma até mesmo em uma sociedade ideal, sem grandes laboratórios patrocinando médicos para aumentar a venda dos remédios, imagine em uma sociedade cada vez mais dependente da necessidade de medicamentos, que assimilou a ideia de tomar antidepressivos como se fosse aspirina.

Por outro lado há o paciente com um distúrbio extremamente particular no corpo. Há quem encare o cérebro como qualquer outro órgão, ou seja, se sofre de alguma patologia, esta pode ser diagnosticada e tratada. Porém é difícil desconsiderar a particularidade de ser um órgão imensamente influenciado por fatores externos. Além das características físicas, existe a mente, a abstração de males que se por um lado são patológicos, por outro não são visíveis e muitas vezes demandam tratamento igualmente abstrato, como a terapia sem medicação.

Caímos em outro ponto delicado: quais traços de comportamento devem ser encarados como patológicos e, portanto, tratados? No filme Emily Hawkins (Rooney Mara) passa por um período difícil. Seu marido acaba de sair da prisão e isso não foi suficiente para por fim à sua depressão e ansiedade. Atualmente, sobretudo em grandes cidades, com o bombardeio de informações, pressões externas, cobranças e ritmo de vida frenético, dá para dizer que aqueles que passarem pela vida sem um período de ansiedade ou até mesmo depressão, formam um traço estatístico irrelevante perto da massa que terá que lidar com esses problemas uma vez ou outra.

Talvez Emily não precisasse de remédios, um tratamento baseado em terapia seria suficiente. Porém o histórico de acompanhamento psiquiátrico – ela já havia feito tratamento com a Dra. Victoria Siebert (Catherine Zeta-Jones) – pesou na hora de testar um novo medicamento.

Não tem como não mencionar mais controvérsias. Por mais que testes de novas drogas sejam feitos em animais (o que em si já desagrada muita gente) é inevitável que em uma etapa final o teste seja em humanos. Como toda droga causa efeito colateral, as bulas dos remédios trazem uma lista enorme e assustadora de adversidades que o produto pode provocar, reduzindo assim as chances de um processo por parte dos pacientes.

Se a hipótese de mover processos é viável, muitas vezes coibida apenas pelo poder econômico de grandes laboratórios frente aos pacientes, por outro lado somos engenhosos em encontrar brechas que compliquem ainda mais uma delicada estrutura, como a relatada relação entre médicos, pacientes, laboratórios e medicamentos.

Diante das peças que não se encaixam na história vivida pelo Dr. Banks, o personagem partirá para uma interessante história de detetive, focada na intuição e cruzamento de informações. Não vale a pena detalhar o final para não estragar nenhuma surpresa, mas o fato é que o enredo do filme expõe fraquezas de um sistema.

Não faltam exemplos na vida real em que médicos e, sobretudo, pacientes são prejudicados de alguma forma. Impossível saber quantos casos sequer são descobertos, porém um fato é evidente: os laboratórios, salvo raríssimas exceções, saem impunes.


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