terça-feira, 7 de julho de 2015

Hector e a procura da felicidade (Hector and the Search for Happiness)

A medicina não é uma ciência exata. Enquanto alguns casos precisam de apenas um comprimido outros devem ser analisados com muito cuidado para a obtenção de um diagnóstico eficaz. Entre esses casos a psiquiatria tem um papel bastante particular.

Encontrar um psiquiatra nem sempre é fácil. Não basta o profissional ter uma boa formação e competência, pois é necessário estabelecer um vínculo muito específico entre médico e paciente. É comum que um psiquiatra extremamente renomado não consiga estabelecer uma relação satisfatória com determinado paciente.

Porém o que acontece nesse filme do diretor Peter Chelsom é que o protagonista Hector (Simon Pegg) não tem conseguido bons resultados com nenhum de seus pacientes e começa a desenvolver questões mais profundas sobre sua própria existência. Suas dúvidas sobre o que é a felicidade e qual o caminho pelo qual deve guiar seus pacientes começam a ficar incontroláveis.

A própria vida particular de Hector já daria uma ótima análise psiquiátrica. Casado com Clara (Rosamund Pike), o casal seguia uma vida linear e aparentemente isenta de problemas, mesmo com Clara fazendo por vezes um papel mais parecido com o de mãe do que com o de esposa. O que fica explícito desde o início é que a felicidade não se resume à ausência de problemas.

Cansado do cotidiano insólito de seu consultório e em busca de uma resposta mais concreta para o que é a felicidade, o psiquiatra parte sozinho para uma viagem pelo mundo. Clara não se opõe e até, como sempre, ajuda o marido em tudo o que está ao seu alcance. Mas para quem até então tinha uma vida constante ao extremo, uma súbita ruptura causa transtornos inevitáveis.

Com o caderno de anotações que ganhou de Clara, Hector parte para a China e visita um monastério, depois viaja para um povoado muito pobre e violento na África para encontrar um amigo médico e de lá vai para Los Angeles, onde encontra uma antiga amiga, por quem era apaixonado.

É claro que o filme não dá uma resposta sobre o que é a felicidade, até porque a dúvida é antiga e nunca se chegou a um consenso. Apesar disso Hector passa por uma série de situações inusitadas e cômicas, nos mostrando nas entrelinhas alguns detalhes que aparecem em nosso próprio cotidiano, geralmente com formas distintas, para que prestemos atenção em tudo o que nos cerca e tiremos algumas conclusões particulares.

Os destinos do personagem não foram aleatórios, ele poderia, ao invés de ir para cantos distintos do mundo, fazer uma viagem pelos países europeus, tudo muito mais prático, porém mais homogêneo. Entre uma grande cidade chinesa e seu distante monastério, um vilarejo na África e a Los Angeles que é quase uma referência do estilo de vida americano há muito pouco em comum.

Com tantas diferenças não dá para imaginar que a resposta sobre o que é felicidade seja a mesma em todos os cantos. Estamos acostumados com um estilo de vida padronizado, consumimos os mesmos produtos, seguimos os mesmos horários, assistimos aos mesmos programas. Talvez este seja o pior legado do imperialismo. A imposição de um padrão único de vida para todos, no mundo inteiro, suprime individualidades e dissemina um padrão, independente de qualquer fator local.

Hector vai aos poucos preenchendo seu caderno com ideias e frases que tentem resumir sua procura pela felicidade. Algumas frases escritas servem somente para uma pessoa, outras são amplas e de interpretação variável, portanto servem para quem quiser interpretá-las de forma conveniente, às vezes uma ideia que remete à felicidade é incompatível com a vida matrimonial.

Talvez o ponto em comum entre as anotações de Hector seja exatamente a felicidade que se pode extrair daquele momento específico. Quando a conjetura mudar e a situação vivida for outra caberá ao protagonista, ou quem quer que seja, encontrar um sentido e um caminho que leve a um sentimento feliz, sempre disposto a aceitar que momentaneamente esse caminho pode não existir. Ninguém é feliz o tempo todo e saber lidar com os momentos difíceis é uma etapa importante da busca de Hector.

O conceito de felicidade é múltiplo, cada pessoa tem sua própria ideia individual e variável, relacionada diretamente com as experiências pelas quais passa ao longo da vida. Ainda que não seja expressa de uma forma evidente, essa parece ser a lição que Hector aprende e talvez tente levar aos seus pacientes. De fato, um psiquiatra que chegue com conceitos prontos para todos os pacientes não parece mesmo muito bem preparado.


Um comentário:

Os Filmes de Frederico Daniel disse...

Filme excelente, 5*. Quantas estrelas deu?

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