O título do filme resume muito bem seu conteúdo. A diretora Estela Renner fez sua estreia em longas metragens mergulhando em um grande problema contemporâneo, que aparentemente só tende a crescer.
Enquanto muita gente ainda sofre sem ter o que comer, boa parte da população passa pelo problema inverso, sofre com a má alimentação que desencadeia uma série de problemas de saúde, alguns tão indiretos que muitas vezes sequer são percebidos.
A diretora mostra que o problema vai além da mesa e é influenciado por diversos fatores, desde culturais até a intervenção direta do marketing, que vê nas crianças alvos fáceis, sem muito discernimento sobre qual a melhor opção.
Não bastasse os apelos comerciais de redes de fast food e os avanços tecnológicos na área de entretenimento, que prendem as crianças por horas a fio diante de um jogo de vídeo game, muitos pais alegam a falta de espaço para lazer, considerando o risco dos filhos saírem sozinhos de casa.
O problema econômico influencia de várias formas. Existem as atividades físicas como aulas particulares de algum esporte, porém costumam ser bem caras; o baixo preço dos alimentos de baixa qualidade; a falta de recursos para tratar do problema, uma vez que a obesidade já esteja estabelecida, e mais uma série de fatores que pesam fundo no bolso das famílias.
Não bastasse a influência direta da economia, existe ainda a influência relativa desta. Um dos grandes atrativos da comida industrializada é sua praticidade. As carnes processadas já vêm praticamente prontas para o consumo, o suco em pó que fica pronto ao ser misturado na água, o macarrão que cozinha em três minutos. A economia de tempo é sedutora, sobretudo para quem trabalha o dia todo, estuda e chega em casa exausto. A conta vem com o tempo.
Por parte da indústria, até existe a necessidade química da adição de conservantes e outros produtos para que o alimento não estrague antes de chegar à mesa do consumidor. Por outro lado, como o próprio nome diz, são indústrias, e têm como objetivo vender e lucrar. Muitos alimentos são literalmente construídos para que o sabor final agrade aos consumidores, cabendo ao marketing ressaltar os pontos positivos (ou mesmo criar tais pontos) e omitir ao máximo os problemas.
Não é raro que um adulto caia nas armadilhas do marketing, não apenas em relação à alimentação, mas quantas vezes não percebemos ao chegar em casa que compramos algo inútil, apenas pelo impulso, ou seduzidos por um cartaz de oferta? Basta pensar que o simples fato de anunciar um produto com preço de 19,99 ao invés de 20,00 já tem efeito positivo sobre a venda. O que dizer sobre lanches servidos com embalagens mirabolantes e brinquedos relacionados os filmes que estão fazendo sucesso? Os pais têm o desafio duplo, pois além do apelo comercial, há ainda a pressão social quando as crianças veem os amigos com esses brinquedos.
Muitos exemplos do filme impressionam pela extrema falta de conhecimento. Tanto adultos, acreditando que o pacote de batata frita tem pouco óleo, quanto crianças, que não sabem sequer identificar frutas e vegetais, mostram grande deficiência na formação nutricional. Essa falta de discernimento sobre os alimentos abre espaço para que a indústria se aproveite da boa fé do consumidor.
Quando uma personalidade muito conhecida associa sua imagem a um produto, a tendência é que as pessoas ignorem o fato de haver um contrato firmado entre empresa e personalidade, que recebe (muito) para indicar tal produto. O que acaba realmente influenciando é a falsa ilusão de que se uma pessoa famosa consome, é porque tem qualidade.
Efeito semelhante tem o peso de uma marca conhecida. Grandes indústrias são vistas quase como sinônimo de qualidade e confiança, na contramão do fato de que para chegar ao topo tiveram que suprimir concorrentes, reduzir custos de produção (leia-se usar ingredientes mais baratos e com menos qualidade) e aumentar as vendas a qualquer custo, mesmo que prejudicando seus consumidores.
Atualmente passamos por uma situação no mínimo curiosa. A humanidade produz alimentos suficientes para alimentar toda a população (vamos, por ora, desconsiderar que essa produção não aconteça de forma sustentável). Enquanto nos vangloriamos de nossa racionalidade, uma parte considerável da população passa fome, enquanto outra luta contra a obesidade.
A desinformação das pessoas em relação aos alimentos não se restringe à nutrição. Parece que o déficit cultural alcança níveis mais elevados, deixando o consumidor sempre em uma condição passiva, recebendo propagandas sem o senso crítico mínimo para julgar idoneidade das mesmas.
(esse é o trailer, mas o filme está disponível no Youtube)
Um comentário:
Acabei vendo esse filme numa madrugada de sábado pelo YouTube e gostei muito do tom informativo e bem humorado que ele apresentou. Muito bom!
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