Com este documentário o diretor Fernando Grostein Andrade propõe um debate aprofundado sobre temas que costumam ser socialmente censurados e normalmente abordados de forma superficial. Mais do que uma bandeira em prol da legalização da maconha, o filme traz exemplos e personalidades renomadas que, mesmo com algumas opiniões divergentes, são unânimes ao afirmar que o atual modelo de abordagem de usuários de drogas não é eficiente – por mais que isso fique evidente em nosso cotidiano, é necessário sempre ressaltar.
Algumas partes deixam latente a falta de estudos consistentes sobre as drogas, não apenas em relação ao efeito delas no organismo, mas dos impactos sociais e políticos dos usuários e das políticas voltadas ao tema. Para tentar driblar essa dificuldade e dar credibilidade às abordagens, o diretor utilizou várias vedetes como o médico Drauzio Varela, o ator Gael Garcia Bernal e, talvez o principal para os brasileiros, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
O político brasileiro é um dos que aparecem no filme assumindo que errou no combate às drogas quando estava no poder e que agora mudou de opinião a respeito do assunto. É possível, porém analisando sua formação e história, é bem mais provável que quando estava no poder optou pelo caminho mais seguro quanto à própria imagem frente aos eleitores: tentar agradar a maioria apoiando a opinião majoritária.
Para qualquer político, propor grandes mudanças em relação a temas obscuros significa mexer em um vespeiro, que pode sepultar definitivamente sua vida política. O que alimenta isso é o preconceito criado pela ignorância em relação ao tema. Não há debates sobre o uso de drogas e o efeito de cada uma no organismo. O que mais se vê é o legalismo, que por um lado tolera álcool e cigarros e por outro coloca todas as outras drogas dentro do mesmo bojo, condenando com veemência qualquer atitude de esclarecimento, geralmente taxada de apologia inconsequente.
Um desdobramento desse preconceito é a criminalização do usuário, viciado ou não, e as políticas públicas desastrosas em se tratando da presença de substâncias proibidas na sociedade. Uma das arestas que veio à tona recentemente e é pouco explorada no filme é a internação compulsória de dos dependentes.
De um lado quem defende a internação, mesmo contra a vontade do dependente, argumenta que em casos extremos o viciado – sobretudo em crack, que está em maior evidência – perde a capacidade de decisão; o que de fato ocorre. De outro quem é contra argumenta que essa decisão pode ser arbitrária, política e inevitavelmente atropela o livre-arbítrio; o que de fato também ocorre.
Um agravante da internação contra a vontade é que mesmo os dependentes que querem se livrar do vício e têm para isso todo o apoio de amigos e familiares, apresentam taxa de recuperação muito baixa em longo prazo, que dirá os que não fazem a menor questão de deixar o vício, internados em clínicas com o padrão “estado brasileiro” de qualidade – podemos comparar com os antigos manicômios públicos, para não dizer os próprios hospitais, para termos uma ideia de como funcionarão tais clínicas.
A desvantagem de quem é contra a internação compulsória é que poucos se arriscam a propor uma alternativa. De fato, a solução em larga escala é dificílima, não basta criminalizar os usuários que se espalham por calçadas de cracolândias pelo país, tão pouco expulsá-los com truculência policial, ou criar leis, visto que se isso fosse suficiente ninguém sequer iniciaria o consumo.
Mais uma vez a falta de pesquisas específicas prejudica, mas muitas vezes quem procura uma droga, de cigarro a krokodil (eu não digitaria isso no google imagens, se fosse você), busca preencher um buraco. Angústia, medo, raiva, ansiedade e uma infinidade de outros sentimentos acabam oferecendo um vazio que muita gente tenta preencher com alguma droga. Muitos conseguem dosar bem a quantidade necessária, mas outros fazem com que esse buraco transborde – os dependentes crônicos.
Tratar um dependente deixando livre das drogas é relativamente fácil, mas o buraco metafórico volta a ficar vazio e precisa ser preenchido. Muitos conseguem com religião, daí a atuação de igrejas em cracolândias e afins, mas não existe fórmula mágica para o tratamento em massa. Cada indivíduo precisa achar sua forma de preencher o vazio antes ocupado pelo vício, caso não consiga controla-lo, e isso é um cuidado que uma clínica estatal, para internação compulsória, dificilmente conseguirá ter.
Criminalizar o diferente costuma ser o caminho mais cômodo, mas o aspecto legal é amplamente abordado no filme. Acreditar que uma lei fará alguém se livrar de um vício é no mínimo inocente. Já que o tradicional modelo repressivo tem se mostrado falho, torna-se pertinente a tentativa do diálogo e esclarecimento, no lugar do preconceito e obscurantismo.
Um comentário:
Eu tive a sorte de ver esse filme quando eu estava viajando Espero que tudo tem a chance de vê-lo, é algo que faz você pensar muito, agora eu tenho um monte de tempo, porque eu estou tentando obter um Aluguel apartamentos buenos aires, pró espero continuar lendo aqui .
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