terça-feira, 19 de novembro de 2013

7 dias em Havana (7 días en la Habana)

A história do cinema cubano está intimamente ligada à revolução do país, em 1959. Uma das primeiras medidas ligadas à cultura foi a criação do ICAIC (Instituto Cubano del Arte y la Industria Cinematográficos) que livrou a ilha dos melodramas até então produzidos e deu início à criação de uma identidade local para os próprios filmes.

Apesar do forte controle estatal, alguns diretores como Alea e Espinosa utilizaram várias vezes seus privilégios, provenientes da amizade pessoal com o alto escalão do governo, para poder retratar a sociedade cubana permeando algumas críticas ao governo, ainda que o apoiassem.

Com a atual crise econômica do país, parte proveniente de décadas sob embargo econômico, parte pela própria dificuldade de girar a economia na contramão do modelo econômico global, o ICAIC não tem condições de patrocinar a grande quantidade de filmes que já foi produzida em décadas passadas. Com isso o país volta a recorrer à ajuda externa, que geralmente ocorre através de parcerias onde o talento para a produção, desenvolvido pouco a pouco no país, é fornecido pelos cubanos e o dinheiro para a produção vem de outros países.

Uma variação deste tipo de parceria é encontrada na produção deste longa. Seis diretores estrangeiros e um cubano produzem sete curtas-metragens, um para cada dia da semana, mostrando algumas características de Havana, sua população, seus costumes e algumas vezes a relação da cidade com estrangeiros, já que o turismo tem peso crescente na economia da ilha.

Apesar do risco de se formar uma visão externa falsa do cotidiano da cidade, exatamente um dos pontos que se queria evitar no início da revolução, além da exposição de ideais contrários aos das mudanças em curso na sociedade, a maioria das histórias mostram a diferença entre cubanos e turistas que permitem críticas ou exaltações, dependendo do olhar que se lance ao filme.

Há em comum certa alienação por parte dos turistas que visitam a ilha, uma visão que beira a inocência, quando comparada ao engajamento dos personagens cubanos. Alguns estrangeiros mostram total falta de comprometimento, encarando a viagem como uma grande festa, repleta de mulheres e bebidas, que geram respectivamente frustrações e problemas.

Entre os cubanos é evidente que, como em qualquer país do mundo, surgem problemas tanto sociais quanto econômicos. O machismo histórico, tão fortemente presente na América Latina, foi combatido ao longo da revolução, porém ainda é fortemente notado, tentando ser contornado no filme com um pouco de romantismo, mas ainda assim com presença marcante.

Outro ponto importante, que pode ser visto como virtude ou problema, é a versatilidade do povo cubano. No lugar da especialização exacerbada, que costuma dominar os profissionais, tomando todo o tempo que o indivíduo tem disponível, notamos que os cubanos exercem suas profissões, mas também são extremamente habilidosos em seus hobbies ou atividades complementares.

Desde o taxista com extrema desenvoltura com o trompete até a psicóloga que vende doces para aumentar a renda, driblando a falta de ingredientes para suas receitas por conta das dificuldades do país, vemos uma sociedade muito mais horizontalizada. Para muitos pode parecer inadmissível que uma psicóloga tenha que cozinhar – uma atividade tão ligada à servidão em nossa cultura –, porém é notável que não haja muitos privilégios de classe e as dificuldades do país são compartilhadas por seus habitantes, não por somente uma parcela deles.

O espírito festivo dos cubanos não poderia ficar de fora, sendo que entre os habitantes da ilha há uma ponderação entre as festas e o trabalho, enquanto os estrangeiros querem apenas a diversão e o hedonismo com fim em si mesmo. Além das comemorações, está presente a religiosidade, seja através da Santeria – uma espécie de candomblé, que une a religião africana ao catolicismo – seja através da devoção à santa católica, na construção de um altar.

Nesses sete dias em Havana temos uma leve noção de como é a vida na cidade. Sem as interferências políticas, vemos que se trata de mais uma cidade, com suas particularidades, diferenças entre estrangeiros e habitantes locais, problemas e virtudes de uma sociedade que, em meio a uma globalização tão feroz mantém um resquício de originalidade, talvez tênue quando vemos jovens dançando algo bem parecido com os detestáveis “pancadões” que temos por aqui, mas indiscutivelmente importantes quando vemos pessoas politizadas e multifacetadas.


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